Relatos

O que nos contam alguns peregrinos.
São simples relatos de suas experiências.

Vento nos Pirineus

Jurema

Já atravessei a montanha 4 vezes. Duas vezes em maio, uma em junho, e a última em outubro/2015 Uma delas, em maio, tive que seguir por Valcarlos, [...]

Vento nos Pirineus

Jurema

Já atravessei a montanha 4 vezes.
Duas vezes em maio, uma em junho, e a última em outubro/2015

Uma delas, em maio, tive que seguir por Valcarlos, sob orientação da
oficina de turismo.
Rota de Napoleão estava fechada.

A última, dia 4 de outubro/2015, num domingo, passei o maior sufoco.
Não era inverno e o dia estava ótimo, mas um pouco depois de Hunto, o tempo
mudou.
Muito vento e chuva fina.

Só sei que foi dramático.
O vento derrubava as pessoas no chão (eu cai duas vezes), e as pessoas que
estavam ali, no meu campo de visão, se agarraram na cerca (eu também, claro),
por muito tempo.
Claro que pra mim foi muitas horas, mas na verdade, penso ter ficado uma
hora, mais ou menos.
Aquilo não passava, e meu rosto já estava meio adormecido, porque quase nem
conseguia falar com as pessoas ao meu lado.
Furei minhas mãos, pois o vento me jogava contra o arame farpado, embora
estivesse segurando firme no mourão.

Sei que foi difícil sair dali, quando eu não aguentava mais ficar ali,
congelando, fui caminhando e segurando no arame farpado, fomos eu e outra
peregrina, agarradas pelo braço, uma segurando a outra, pra não cair.

Faltando pouco pra chegar em Orrison, dois jovens, peregrinos americanos,
vieram nos ajudar, nós e aos outros que ali estavam.

Quem estava já no alto, onde tem a Santa, foram resgatados pelos carros que
ali passavam, pois o vento lá era bem mais forte.

Foi uma experiência que não gostaria de passar de novo.
Mas tudo faz parte do caminho!

O ruim é quando não acaba bem!

Caminho Francês

Fernando (Curitiba)

Meu nome é Fernando, tenho 36 anos moro em Curitiba, sou professor de educação física,  trabalho com personal e professor de jiu Jitsu para [...]

Caminho Francês

Fernando (Curitiba)
Meu nome é Fernando, tenho 36 anos moro em Curitiba, sou professor de educação física,  trabalho com personal e professor de jiu Jitsu para crianças.
Tenho o Caminho de Santiago de Compostela mais ou menos há 4 anos em minha cabeça.  Esse ano, no dia 12/06/2017 consegui realizar esse sonho. Tudo foi mágico e contínua sendo.
Realizei o caminho em 26 dias, fiz “sozinho”, por alguns dias caminhava e compartilhava os albergues com as mesmas pessoas,  e depois me separava conhecendo mais pessoas. e sempre tive na cabeça de fazer o caminho só.  Que achei perfeito.
Muitas pessoas falam que eu estava fazendo muito rápido,  e em alguns dias fiz mesmo, cheguei a fazer etapas de 50 km em um dia, e assim seguia me alterando com os quilômetros. Gosto muito de atividade física, meu corpo e mente estão trabalhando o tempo todo juntos, por isso acredito eu que me superava em fazer alguns quilômetros a mais. Porém sentia dores todos os dias, calos e bolhas do início ao fim do caminho, usei vaselina e depois talco, mas nao adiantava muito, teria que passar por isso.
Sobre as paisagens que vi, tirei muitas fotos,  mas as melhores estão em minha cabeça,  onde pode olhar e sentir tudo aquilo.
Sobre as pessoas que conheci: maravilhosas, foi realmente abençoado com todos que tive o prazer de passar momentos, somando muitas histórias.
Sobre Deus: pode sentir a presença dele todos os dias no me caminho, as vezes por um pequeno gesto de um desconhecido,  ou pela própria natureza.
Enfim, quero poder vivenciar tudo isso novamente algum dia.

Caminho Francês - 2018

Fernando (Rio)

Primeiro quero agradecer toda a ajuda que recebi da Associação, alguns associados e em especial pessoas muito queridas, como você, Paulo, Lili, [...]

Caminho Francês - 2018

Fernando (Rio)
Primeiro quero agradecer toda a ajuda que recebi da Associação, alguns associados e em especial pessoas muito queridas, como você, Paulo, Lili, Gustavo e Ney. Foram incontáveis dicas, aulas, estórias e roteiros, enfim uma valiosíssima experiência de veteranos para um novato como eu, sem a qual meu caminho seria bem mais difícil. Não posso deixar de agradecer também a maravilhosa oportunidade de poder compartilhar com o grupo as reuniões e as caminhadas duas vezes por mês. Desde setembro, a primeira sexta-feira do mês é seguramente um ponto alto no meu mês, que me proporciona enorme ansiedade e alegria de participar.
Como eu não podia me ausentar do Rio por tanto tempo, escolhi começar do início e saltar algumas etapas no meio, caminhando apenas 27 dias, pois queria fazer o Francês do início ao fim. Para isso contei com os sábios conselhos do Paulo.
Comecei o caminho no dia 7 de maio de SJPP, sozinho. Cheguei em Pamplona de avião no dia 5 à tarde, fiz algumas compras de material e visitei a cidade. Segui para SJ no dia 6, mas como era domingo, só havia um horário de ônibus às 14:30. Muito eufórico nem consegui dormir direito. Meu primeiro dia já foi sofrido, pois a subida até Orisson foi bem mais pesada do que imaginava. Levei 4:30 para chegar, muito cansado, e ainda tirei um cochilo no meio do trajeto. A subida da mesa do Imperador é café pequeno perto daquilo. A partir do dia seguinte fui bem.
Na etapa Estella – Los Arcos criei duas bolhas internas nas solas dos pés, que me assombraram até quase o final, aumentando a cada dia. Só lembrava do Helio falando numa palestra recente que seu primeiro caminho foi muito doloroso. O meu também foi de muita dor. Como estava determinado a terminar o caminho, não parei nenhum dia. Sempre dava um jeito de combater as dores (com pouco sucesso) e seguir em frente. Cheguei a ir ao hospital em Logroño e gastei um boa grana em curativos, ibuprofeno e despacho de mochila, e mesmo assim percorri 2 etapas inteiras e encurtei outras 5 em ônibus. As outras 20 fiz conforme o planejado. As dores das bolhas só começaram a ceder em Sarria e terminaram em Arzúa.
Dores e sofrimentos à parte, foi uma experiência muito enriquecedora. Aprendi muito, conheci muita gente legal (alguns nem tanto) e fiz vários amigos brasileiros e estrangeiros, com os quais me relaciono até hoje, apesar das enormes distâncias. Ajudei pessoas e fui ajudado. Anjos certo? Conheci lugares incríveis, apreciei as vistas mais lindas e soube o que é viver com o pouco que cabia na minha mochila. Tinha momentos de enorme alegria, outros de esperança, de fé, mas também alguns de tristeza, de medo e de incerteza. Alguns de poder e muitos de fragilidade. Ri, sorri e dei muitas gargalhadas, mas também chorei e me aproximei mais de Deus. Acho que tive uma visão perto de Cirauqui, entre Puente La Reina e Estella. Comi menus peregrinos até cansar, cozinhei nos albergues e bebi muito, muito vinho. Deixei a barba crescer, peguei um bronzeado em Castilla e perdi uns quilos (os quais ac hei aqui no Rio). Superei alguns desafios, que eram parte de minha motivação para fazer o caminho, como dormir em albergues, perder a inibição e fazer amigos, vencer as etapas, dia após dia, e principalmente não desistir. Me senti um campeão por isso, e cresci como pessoa.
Como vê, toda esta experiência só pude ter graças ao incentivo e o apoio de vocês. MUITO OBRIGADO DE CORAÇÃO.

Caminho Português da Costa - 2018

Guilherme (Rio)

Escrevo para relatar um pouco da minha experiência no Caminho Português da Costa o qual iniciei no dia 17 de setembro em Porto e terminei 11 dias [...]

Caminho Português da Costa - 2018

Guilherme (Rio)
Escrevo para relatar um pouco da minha experiência no Caminho Português da Costa o qual iniciei no dia 17 de setembro em Porto e terminei 11 dias depois naturalmente em Santiago de Compostela.
Fiz o trajeto na seguinte ordem: Porto-Matozinho-Vila do Conde-Exposende-Viana do Castelo-A Guarda- Baiona-Vigo-Redondela-Pontevedra-Caldas de Reis-Padron-Santiago.
A parte portuguesa do caminho é linda. São paisagens de praias de mar bravio percorridas em sua maior parte por passarelas de madeira. Eu gostei muito. Não encontrei muitos peregrinos. Mas é claro que havia alguns. Os albergues são bastante razoáveis. mas não muito numerosos. Vi pessoas tendo que andar mais 5 km pela falta de hospedagem. Isso se deve, em parte, a crescente popularidade do Caminho em geral e do Caminho da Costa em particular. O clima estava um pouco quente com alguma chuva. Mas a hospitalidade portuguesa compensa tudo e a caminhada se dá com naturalidade.
A partir da cidade de de A Guarda, após a travessia do rio Minho de barco entramos na Galícia, minha província favorita na Espanha. Aqui a lingua portuguesa também é entendida. Ressalto que o albergue nessa cidade é bastante simples. Me refiro ao Municipal.
A partir de Baiona encontramos uma paisagem , ainda costeira mas já com as características galegas de bosques e manhãs com neblina, tudo muito bonito.
Gostei muito de Redondela e Pontevedra, cidades onde os peregrinos são muito bem recebidos com muitos albergues e comida de qualidade. As partes antigas dessas cidades são imperdíveis.
Caldas de Reis e Padron estão naquele sprint final da caminhada quando já sentimos que o nosso destino destino está próximo e o sentimento é diferente.Em Padron pernoitamos no Albergue “As Corredoras” que recomendo fortemente.
Bem … Não sendo evidentemente o Caminho Francẽs, considero o portuguẽs uma versão reduzida deste. As mesmas características legais estão lá: a possibilidade de meditação nos longos trechos, as pessoas legais, tanto peregrinos como moradores locais, que encontramos pelo caminho e que nos deixam muito felizes. Me senti muito bem nessa caminhada e muita coisa vai ficar no meu coração para sempre. A jornada é o mais importante.
Recomendo.
E agradeço à AACS pelas orientações e apoio.

Caminhando só

Telma (São Paulo)

Eu caminhei por 10 dias, iniciando por Astorga, no caminho francês. Eu tinha me planejado a fazer 26km em média/dia, mas o Caminho me ensinou [...]

Caminhando só

Telma (São Paulo)

Eu caminhei por 10 dias, iniciando por Astorga, no caminho francês. Eu tinha me planejado a fazer 26km em média/dia, mas o Caminho me ensinou que mais importante que chegar, é viver o Caminho a cada momento, “se entregando” à aventura. Fui sozinha e descobri que para ficar realmente sozinha é bem difícil… que bom!

Vivi momentos marcantes no Albergue do Jesus Jato, no Albergue brasileiro em Vega de Valcarce, no Cebreiro, em Triacastela, em Santiago, e claro, durante toda a caminhada. Jesus Jato já é um personagem famoso do Caminho e é importante destacar o carinho com que somos recebidos por eles. O jantar coletivo foi inesquecível, uma torre de babel com a melhor paella da minha vida!!! O albergue brasileiro é outro lugar imperdível. O carinho e atenção da Xênia e do Bráulio, o jantar brasileiro e a atmosfera de LAR, são especiais!!! Isso sem citar que vivem de doações… eu nunca tinha visto nada parecido. Vega de Valcarce é singular, com riozinho, com castelo em ruinas, restaurantes simpáticos… amei tudo. Ótima parada para a preparação da subida do Cebreiro.

O Cebreiro parece cenário de filme… talvez do Harry Potter!! Parece piada, mas tem uma lógica… uma lógica celta. Os cenários do Harry Potter são inspirados na Escócia, Edimburgo, que tem influência Celta. O Cebreiro também. As casas, aquela névoa no começo e final do dia… é fantástico, mágico. Comi as melhores costeletas da viagem!!!

Em Triacastela tive “tipo uma epifania kkkkkkkk”. Tinha chegado na metade do meu caminho, e apesar de estar com meus tendões de Aquiles inflamados e doendo, de ter dormido em albergues com 50 pessoas roncando num quarto, das milhares de subidas e descidas, da descoberta que descida é pior que subida…. que eu estava AMANDO tudo. Quando cheguei no albergue com minhas amigas brasileiras, eu comecei a falar o que eu tinha acabado de constatar: “Eu amo esse caminho, eu amo os albergues, amo Menu Peregrino, amo os peregrinos, amo lavar minha roupa, amo jantares coletivos, amo as pessoas, amo, amo… A moça séria que nos recebeu no albergue teve um ataque de riso com minha “declaração universal de amor”. A partir de Triacastela precisei tomar ônibus para me poupar e chegar na data marcada em Santiago. Assim, cheguei em Santiago no dia 5/10 (no dia da mi nha reserva no Parador dos Reis Católicos em frente a catedral, um luxo que eu adorei). Caminhei 200km, ou 20km/dia, e entendi que esse é o máximo que consigo. O ideal é que seja até menos por dia, para não forçar demais os tendões e realmente aproveitar o caminho.

Eu poderia continuar contando um monte de coisas, mas acho que sintetizei os eventos de caráter mais prático que me marcaram. Acho que acrescentaria a importância de ressaltar como o Caminho é seguro. Eu havia decidido ir sozinha, mas fiquei com um “medinho”. Eu gostaria de ter lido em algum lugar que o “Caminho é muito seguro e que uma mulher sozinha pode fazê-lo sem receio”.  No trecho que fiz, na época que fiz, eu também diria que não é necessário fazer reservas. Mas acho que bem é pessoal e eu precisava praticar “acreditar no Universo”. Quando parei de me preocupar, os lugares, reservas… simplesmente  apareciam. Claro, se você quer ficar num hotel X ou um Parador, melhor reservar.

Minha experiência foi muito breve em todos os sentidos, inclusive breve com vocês. Eu não tenho nenhuma sugestão específica. Vocês foram super rápidos e solícitos quando escrevi, e me mandaram tudo o que eu precisava. Muito provavelmente vocês tem uma série de serviços que eu nem descobri. Talvez uma lista dos albergues no site, bem friendly para ser consultada, com uma classificação de serviços, uma breve descrição dos “atrativos”, foto, talvez fosse legal. Vocês mandaram uma, tem sites que tem algo assim… não sei se isso é necessário ou tão diferente.

Enfim, obrigada por me ajudar a fazer uma das melhores viagens da minha vida!!!

Um grande abraço, Telma

O Peso da Mochila

Nilza (Fortaleza)

Nossa mochila é do tamanho de nossos medos… é cheia de “se”: se isso, se aquilo… Assim, ao invés de levarmos 2 comprimidos de relaxante [...]

O Peso da Mochila

Nilza (Fortaleza)
Nossa mochila é do tamanho de nossos medos… é cheia de “se”: se isso, se aquilo…
Assim, ao invés de levarmos 2 comprimidos de relaxante muscular, levamos uma caixa. Ao invés de levarmos um vidrinho de xampu para ir repondo, levamos xampu pro caminho inteiro.
Levamos remédios pra dor de cabeça, de barriga, gripe e tantas outras coisas pra “se precisar” e que – na maioria das vezes – não precisamos.
Na verdade, talvez por ironia de Santiago,  muitas vezes precisamos de coisas que nem imaginamos (lembre que passamos por aglomerados urbanos que têm onde comprar “se” precisarmos).

Chega um momento no Caminho que as costas e os pés doem e sentamos, derramamos no chão tudo o que tem na mochila e vamos separando o que REALMENTE importa pra levarmos conosco, o que vamos mandar pelo correio (“correio de Santiago”), o que vamos deixar pra quem quiser e o que vamos colocar fora.

Esse “desapego”, enfrentamento de nossos medos e o aprendizado de que quase nada no Caminho (e na vida) está sob nosso controle faz parte do Caminho.

Na verdade, aprender a arrumar a mochila é a maior lição do Caminho!

Acalme seu coração e se permita levar em sua mochila seus medos – faz parte do Caminho!

“O Caminho se faz caminhando!”

O Que o Caminho Revela

Arlete (Recife)

Foi a experiência mais incrível diante dos meus 61 anos. Conheço mais de 30 países, ja morei na Africa, mas nada se compara aos dias lá vividos. Foi [...]

O Que o Caminho Revela

Arlete (Recife)

Foi a experiência mais incrível diante dos meus 61 anos. Conheço mais de 30 países, ja morei na Africa, mas nada se compara aos dias lá vividos.

Foi um sonho que demorou 2 anos para se realizar e que com treino, prudência e coragem  transcorreu tudo correu bem.
O meu sentimento é que o Caminho nos revela tudo aquilo que já tínhamos dentro de nós, o que somos no nosso cotidiano, nas coisas simples, no compartilhar, nas boas ações….procuramos algo que já temos dentro de nós: solidariedade, alegria, tristeza, momentos de introspecçao, perdão, saber viver no coletivo…
Também tive uma experiência negativa e o Caminho me deu forças para superar ( forte reação alérgica aos chinches me fez pensar em parar), pois mesmo com a prescrição de corticóides a alergia se prolongou por quase todo meu percurso.
E a volta é um misto de sentimentos. De completude, de alegria, de querer contar tudo para todos os familiares e amigos e, também, um vazio, uma vontade de retornar, continuar caminhando….
Acho que é um sentimento vivido pela maioria dos peregrinos.

Percepção Pessoal

Rodrigo (São Paulo)

Foram 6 dias de caminhada desde Sarria a Santiago. O início incerto e estranho de caminhar para um destino sem saber o que iria encontrar, quanto [...]

Percepção Pessoal

Rodrigo (São Paulo)

Foram 6 dias de caminhada desde Sarria a Santiago.

O início incerto e estranho de caminhar para um destino sem saber o que iria encontrar, quanto tempo demoraria, quais as dificuldades no trajeto percorrido eram enormes nos primeiros minutos do primeiro dia. Mas aos poucos essa insegurança se aliviava com a presença das setas amarelas que me guiavam e me mostravam o quanto faltava para chegar a Santiago.
Frio e chuva me acompanharam nos primeiros dois dias. Foi algo que tão pouco eu estava acostumado. As setas amarelas agora pareciam aumentar minha ansiedade a medida que a quilometragem não diminuía na mesma proporção que o cansaço aumentava. Foi ai que entendi um dos objetivos do caminho…dialogar comigo mesmo e vencer minhas dificuldades e limitações. Enxergando nos marcos o quanto faltava para Santiago de Compostela, deixava de ver o quanto já havia progredido na caminhada, quanto já tinha me superado e não dava valor para meus feitos e sim aumentava a dificuldade intrínseca do caminho ao pesar mais a distância que faltava do que a distância percorrida.
Além disso, lidar com a ansiedade foi algo fundamental.
Entender qual é a minha própria natureza, meu jeito de me comportar nas situações, minha real natureza.
A natureza…sim, o caminho de Santiago te proporciona algo que temos o tempo todo, mas nunca damos o devido valor por culpa do tempo que temos sempre correndo contra nós. Mas quando você tem o controle do tempo, pode aproveitar a natureza e essa sim reserva coisas muito lindas que também fazem os olhares se encantarem. Mas mais que isso, fazem você enxergar o seu interior e se compreender.
Em dado momento, você percebe que já transcorreu metade do caminho e a impressão que tive é que os dias seguintes fossem mais devagar para passar, que o tempo parasse ali e não acabasse aquela benção que eu recebia. O caminho é muito gostoso de viver.
Neste momento, o tempo frio e chuvoso dava lugar a um tempo de sol e calor. Agora, o transtorno era reclamar do calor, assaduras e cansaço e pedir para que a chuva e frio voltassem.
Mas novamente, a reclamação era expurgada quando a cada ser especial que você encontrava no caminho olhava para você e com um sorriso dizia “Buen Camino”. Cada hora num sotaque, é verdade, mas não importava a dificuldade, o cansaço ou a dor, o sorriso nunca faltava. E isso sim é forte. O sorriso de alguém que está ali com você faz com que as energias rebrotem e te deem novo gás para continuar. É gratificante estar envolto nessa energia contagiante.
Por fim, mas nem de longe o menos impactante, vem a chegada a Santiago de Compostela. A ansiedade controlada durante dias, parece nesse momento um animal indomável. O mais maravilhoso estaria por vir, a chegada na praça da catedral. Nesse momento, um filme volta na sua cabeça e todos mínimos detalhes vivenciados durante a experiência do caminho são relembrados, culminando naquele exato lugar, hora e ser. Isso sim é um sentimento real de alegria e felicidade plena.
Do começo ao fim, o caminho lhe traz aprendizados e lhe permite ensinar, rezar e buscar seus objetivos. A experiência desses dias são maravilhosas, mesmo que você venha a reconhecer isso tempos depois. Há quem diga que quando temos uma experiência muito forte em nossas vidas, levamos 72 horas para absorver todas as consequências daquele evento. Um evento como o Caminho de Santiago de Compostela certamente trará reflexos para a vida toda e felizes serão aqueles que permitirem que essa experiência não seja somente um evento isolado, mas sim algo que lhe modifique para sempre.
Um prazer poder dar um depoimento sobre o que foi uma das melhores viagens da minha vida.

Em Grupo

Miriam (Juiz de Fora)

O que tenho a dizer do Caminho é que foi indescritível. Fiz o Caminho Francês em 26 dias sem sofrimento. A média que caminhei por dia foram [...]

Em Grupo

Miriam (Juiz de Fora)
O que tenho a dizer do Caminho é que foi indescritível.
Fiz o Caminho Francês em 26 dias sem sofrimento.
A média que caminhei por dia foram de 34 a 40 km. Apenas dois dias que passei de 40km.
Tive a companhia de dois do grupo que fui (fomos em 32 brasileiros de Juiz de Fora/MG). O grupo dispersou todo, por conta de ritmos diferentes, bolhas, canelites, etc.
Desses 32, 9 completaram o caminho sem terem que recorrer a despacho de mochila, táxi, trem…
Fiquei entre esses 9.
Não tive nada…nem bolhas..nem dores…apenas o cansaço normal.
Fiquei deslumbrada com tudo…muitas cidades bonitas…igrejas… pontes e ruazinhas de pedra. A sensação é ser tele transpordada para a Idade Média.
Me perguntei no final…qual o mistério do Caminho??
Será que consigo responder essa pergunta???
O mistério do Caminho é cada passo que damos…cada km percorrido…cada Buen Caminho…cada Menu do Peregrino…cada missa…cada igreja…cada momento vivido.
A chegada é uma sensação de “dever cumprido”…de querer mais…que pena que acabou…alívio…conquista…e…um vazio. E agora????
Durante 26 dias minha rotina era caminhar…caminhar…e…caminhar…
A vontade é de voltar hoje mesmo. É de refazer tudo. É de estar lá novamente…é de não ter voltado.
Eu quero. Tenho certeza que o Caminho não saiu de mim ainda e não sairá.
Tenho certeza que estarei lá de novo.
Tenho certeza que foi algo indescritível.
Bom…muito bom.